sexta-feira, 5 de dezembro de 2008

coisas que eu tinha esquecido que gostava:

de elliott smith;
de andar de ônibus ouvindo música;
de chegar em casa.

domingo, 23 de novembro de 2008

há quase um ano, eu me sentia igual a hoje.

aquela expressão de abandono
o rasgar do abandono
ou simplesmente o abandono
assim sozinho
sozinho
o abandono de si
sem querer
mas sendo,
assim sem querer
abandonado

(escrito em dezembro de 2007. depois de uma visita ao tate, um café e uma caminhada na beira do river thames, sozinha)

sexta-feira, 14 de novembro de 2008

Sono

vou dormir o sono dos justos
justo eu, na injustiça do sono!
durmo no desossego do susto
na preguiça do bocejo
mudo no mundo do sonho
a dor que dormiu em mim
dream, mar de dream, madre sonho,
dói dormir assim

quarta-feira, 5 de novembro de 2008

segunda-feira, 3 de novembro de 2008


Um Livro de Idéias:

Sempre tive idéias mirabolantes. Crio coisas na minha cabeça e fico imaginando elas acontecendo como se fossem coisas que já tivessem existido; aparecem na minha lembrança como passados já consumados. Porém, como sempre nada dessas coisas realmente acontecem e elas ficam como projetos mal resolvidos boiando na minha cabeça, pois nunca consigo concretizar até o fim um plano.
Foi em um sábado idiota, eu estava deitada na cama ouvindo a mais depressiva das músicas para um final de semana nojento, sonhando com instalações, fotografias, vídeos, performances e desenhos geniais (os quais jamais realizarei), que tive uma idéia! Era óbvio, porque não havia pensado nisso antes? Fazer um livro de idéias, claro, era tudo o que eu precisava! Um trabalho que é um livro onde eu anoto todas as idéias que eu tiver, crio maquetes desenhadas, faço todo o projeto para ser realizado por alguém com um pouco mais de iniciativa do que eu.
Porque o ponto que eu tranco é na ação, no preparar para agir, na preguiça de seguir em frente e de expor aos olhos alheios uma idéia normalmente capenga e quase incabível para o mundo. Mais uma vez vejo que a solução é exatamente esta, tornar o trabalho a idéia e me desprender da produção, deixando o outro, mais ativo e convicto, concluir o meu plano, criando assim um trabalho em conjunto onde não se sabe até que ponto o artista é idealizador ou feitor.
Um livro onde a minha passividade se transforme em atividade de alguém. Proporcionar um momento criador, de quase brincadeira, brincando de artista e se tornando um. Assim, o outro se apropriaria da minha idéia sendo autor como eu.

Indicações: Joseph Kosuth, Dário Ribeiro, Donaldo Shuler (ainda não sei porque), Hélio Oiticica (como sempre) e Cildo Meireles

sexta-feira, 31 de outubro de 2008

secretaria do desastre

Por motivos de segurança, me arrancaram os olhos e o coração.
De certo tinham certeza do que faziam
Estavam estabelecendo o novo sistema de felicidade
Puxaram a descarga com todo resto
Fui inteira pelo ralo
E disseram que assim seria melhor pra mim.
Talvez até tenha sido
Hoje já não sinto
E posso dizer que sou feliz

domingo, 26 de outubro de 2008

Eckhout, me descreva


[.........] Todos esses elementos colocados por Eckhout nos fazem entender exatamente o que é o povo brasileiro: um sangue mestiço, culturas que se interpenetram em um só país. Eckhout não sabia que depois viria a ser tão reconhecido outro mulato nas mesmas terras, Aleijadinho viria legitimar a sua hipótese sobre o Brasil E, evidentemente, haveria de vir os outros, como anos mais tarde o mulato seria exaltado por Jorge Amado em seu romance Gabriela, Cravo e Canela e novamente em 1967 pelos tropicalistas na voz de Caetano Veloso “Os olhos verdes da mulata/ A cabeleira esconde atrás da verde mata/ O luar do sertão”. Se Albert Eckhout veio ao Brasil observar e captar a diferença deste mundo em relação ao outro, conseguiu. Diferentemente do que viria a ser a Missão Artística Francesa do século XIX, Eckhout foi verdadeiro nas suas telas, mesmo não tendo presenciado a Dança Tapuia, por exemplo, soube ser sincero na sua representação, não abusando do imaginário.

sábado, 20 de setembro de 2008

O pedaço no papel

Minhas mãos estavam tensas de não saber por onde começar. Parecia que todas aquelas recomendações, todos aqueles traços ensaiados simplesmente haviam se escondido em mim.
Segurei o lápis bem forte, no alto, como um imperador dando uma ordem ao papel.

O papel tão branco, árido de triste, deserto de neve refletindo no meu olho.

O grafite rasgou de leve, envergonhado, deixou um cinza,
cinzinha sujo, patético.

Meu punho largou. Não suportei a dor daquele cinza ridículo, daquele risco indefeso me ameaçando a integridade.

Peguei de novo o lápis, mais corajosa e menos amedrontadora, agora como um maestro, impinei o nariz mais alto do que o morro branco e fui.

Ataquei com um risco ríspido e seco, na gargalhada do inimigo, destemida. Consumindo o branco, jorrando sangue na geleira. E mais, e mais… até que o pecado se tornou prazeroso! Arranhei todo o véu sagrado com as unhas pretas e sem vergonhas, carbono sem dó, demônio do mais negro fervor.

Soltei minha adaga no ar. Sentindo-me leve, virei as costas para o papel.
Deixei ali o meu inacabado, o meu esboço de mim, o meu cuspe de medo, todos os segredos que se revelam em gestos. Imperfeito, sujo e mal resolvido pedaço de mim.

terça-feira, 9 de setembro de 2008

domingo, 7 de setembro de 2008

Ainda Onda: Edith

a exposição de edith derdyk me chamou atenção para além dos papéis brancos e dos parafusos enferrujados, mas sim, para a eterna atribuição e busca do artista à onda, as entrelinhas da onda do mar. edith se baseia em manuel bandeira, que antes também havia encontrado lá as respostas ao tempo (ou pelo menos uma rima para seu poema).
cildo meireles, em seu marulho faz a mesma conexão, trazendo o espectador a uma sala de mar de livros. desta vez lembrando-nos os marilivros de haroldo de campos e suas ondas escritas em palavras.
a conclusão é inevitável: existe um mergulho da arte brasileira no ir e vir das ondas. o que se pode ler visualmente no azul de cildo e no branco gélido de edith. é como se no mar, o brasileiro encontrasse sua identidade, sua realidonda. assim como caymmi (a quem também atribuo referências inegáveis nestes trabalhos), que em suas músicas descrevia como era doce morrer no mar, nas ondas verdes do mar. sem querer, todos fazem parte de um todo.
acredito que edith em ainda onda não nos remeta a apenas um, mas a todas poetas. tanto a verborragia de haroldo, ao azul de cildo, a melancolia de dorival e finalmente aos poemas de manuel. ainda onda é uma obra completamente referencial a toda criação brasileira.

domingo, 31 de agosto de 2008

dó e ré
notas
de rodarpé

Memórias, depois de Perec:

1.
Me lembro de estar sentada no vaso da casa de meu avô, de seguir com os olhos a rachadura na parede do banheiro e me perguntar futilmente se ninguém mais se incomodava com a fenda. Lembro-me da luz amarelada, das paredes envelhecidas e de imaginar baratas entrando debaixo da porta.

2.
A capaínha da casa de meus avós nunca funcionou direito, assim como o interruptor do banheiro. As instruções sempre foram:
Para a campaínha: apertar bem forte mexendo levemente o dedo pela bola preta, até que de repente um ruído rouco grita lá de dentro, acompanhado por um "Não tem ninguém em casa".
Para o interruptor: bater rapitamente repetindo o processo duas ou três vezes até que dá-se a luz.

3.
Minha avó guarda copos na geladeira e panelas no microondas.

4.
Na rua onde meus avós moram tem uma casa com grades e lajotas brancas, onde tem um cachorro vira-lata. Certa vez eu e a vó entramos lá, ficamos só na porta. Lembro-me de oferecerem sucos muito amarelos, bebemos e fomos embora.
Alguns anos depois perguntei para a vó como estavam aquelas pessoas, ela estranhamente me confirmou que sequer conhecíamos aquela gente. Foi então que eu percebi que aquela lembrança não passava de um sonho de lembrança e que talvez fosse por isso que só conhecíamos a entrada da casa.

5.
Na casa da minha prima, como sempre, brincávamos de esconder. Me escondi no quarto dela, o tempo passou, saí de meu lugar, olhei pela janela o pátio. Abri ridículamente a boca sem motivo algum. Uma mosquinha de banheiro pousou em minha língua. Senti uma mistura de pânico e fascínio, soltei um grito, o bichinho voou e fui descoberta na brincadeira. Até hoje não entendo como não senti nojo daquela mosca.

sábado, 16 de agosto de 2008

texto sem fim

é impressionante o problema que eu tenho com finais de histórias. nos últimos tempos todos os livros que eu leio não consigo chegar ao final. parece que vem o fim, a história se perde na minha cabeça e a conclusão não se torna mais necessária.
não entendo o que acontece. simplesmente a vontade some, as unhas saltam dos dedos para serem roídas, as histórias perdidas que nunca aconteceram se tornam teatro de um passado que eu não tive, os fatos de hoje ecoam envergonhados nas palavras que eu não deveria ter dito. tudo de repente pulsa, até a simples saliva cansada na boca se torna amarga no engolir do dia, no momento da leitura. no fim. no ridículo final do livro.
não sei se é falta de costume de finalizar, de concluir pensamentos, mas parece que fiquei presa na vírgula e que qualquer ponto final se torna assustador. desisto, desisto de tentar ler os finais dos livros, de saber os finais das histórias, ou mesmo de tentar finalizar este texto... já que eu não vou ler mesmo,
mesmo.

segunda-feira, 11 de agosto de 2008












7 meses

é engraçado, estando no velho mundo descobri que sabia menos da américa do que da vida da rainha. nesse momento desisti de stones, beatles e bowie para ouvir a transa de caetano no mesmo dilema sobre london, london que eu, e o gil transformando meu yesterday em back in bahia. de repente me senti o marinheiro só das águas do norte e precisei viver a itália de chico para apreciar um brasil esquecido.
agora de volta vejo o brasil com outros olhos, não me parece o mesmo país que eu vivi por todos esses anos. vejo um jovem envelhecido, com o rosto fresco num sorriso de dentes tortos. o brasil dança cansado desde que o samba é samba.
então resolvi chamá-lo de mundo perdido, e estamos. a nossa descoberta não passou de mentira, estamos estagnados no antigo sonho americano, que para nós de nada adianta, pois o brasil ainda está perdido na tradução do seu português emprestado.

nero café, london bridge, london 2007

sentada no café todas as xícaras brancas me olham. olhares brancos e brilhantes. olhos cegos arregalados em mim. o cheiro de café gelado e a madeira que ecoava a cada passo. o café frio na minha frente tremia por não ser bebido. as xícaras sujas choravam o negro resquício na sua brancura dramática. e nesse momento, ou curto espaço de tempo, me deu vontade de chorar por elas. chorar como elas, um choro preto e esquecido.